sábado, 22 de setembro de 2012

A deusa da paz

Irene ou Eirene é uma das três Horas, que presidem as estações do ano. Rege a primavera, às vezes é representada em vasos com um ramo florido na mão. 

Era cultuada em Atenas, onde tinha uma estátua ao lado da de Héstia, deusa do lar, que personifica a o fogo e a lareira circular, centro da casa e do templo. O culto de Irene foi instituído depois de uma vitória ateniense, talvez sobre Esparta, e anualmente era feito um sacrifício em sua honra.

Irene
Irene e Pluto
A estátua mostra Irene com Pluto, deus da riqueza, ou antes, da abundância dos frutos da terra, filho de Deméter, deusa da agricultura. 

Em outras representações Irene traz a cornucópia. A abundância só é possível na paz.

Irene é uma das filhas de Têmis, a lei natural ou divina, as regras de conduta consagradas pelo costume. Suas irmãs são Eunômia, boa ordem, e Dikê, justiça.

Força que mantém as pessoas unidas, consciência coletiva, Têmis é justiça e direito, primeiro da aldeia, depois da pólis.
No oráculo de Delfos, que presidiu depois de sua mãe Gaia, mostrava às pessoas como seguir suas leis, que eram naturais, diferentes das leis instituídas pelos homens. 
Além das Horas, é também mãe das Moiras, as tecelãs que determinam a vida de cada ser.  

Na versão posterior do mito, olímpica, surgida depois da conquista pelos povos guerreiros, Têmis é transformada em uma das esposas de Zeus, a segunda. Sentada no trono por trás dele, é quem o aconselha em assuntos de justiça. 
Mesmo nessa nova versão, apenas ela pode convocar a assembléia dos deuses no Olimpo.  

Com essa mudança, Zeus se torna o pai de Irene. 

Em 1851 foi descoberto em Londres o asteróide 14 Irene, que recebeu esse nome porque então se realizava na cidade uma exposição industrial que simbolizava os produtos da "civilização, Paz, Arte e Ciência, que interessam a toda a humanidade".

Fonte:
Charlene Spretnak, Lost godesses of early Greece
Jean Shinoda Bolen, As deusas e a mulher

quinta-feira, 28 de junho de 2012

O melhor dos homens

Homero escreveu na Ilíada a tradição oral sobre a guerra de Tróia, do ponto de vista do vencedor.

No livro descreve Aquiles, o herói grego, como um jovem impulsivo, violento, mal-humorado. Seus atos incluem o assassinato de um adolescente desarmado que acompanha a irmã e outras mulheres ao poço onde pegam água para a cidade sitiada.
Bronze etrusco, séc. III a.C.
O mesmo Homero descreve Heitor, o príncipe troiano, como um homem amante da paz, tão previdente quanto corajoso, bom filho, marido e pai, e sem motivos escusos, que não queria a guerra contra os gregos.
Sabe estar indo encontrar a morte mas sabe também que esse é seu dever para com sua cidade e seu povo. O melhor guerreiro entre os troianos e seus aliados, suas proezas na luta eram admiradas também pelos gregos.

Após dez anos de cerco grego a Tróia, Heitor precisa sair da cidade e liderar o contra-ataque aos gregos. Sua esposa Andrômaca, carregando nos braços seu filho Astianax, o intercepta no portão, intimando-o a não sair pelo bem dela e do filho. Heitor sabe que Tróia e a casa de Príamo estão condenadas a cair e que o destino sombrio de sua esposa e filho será morrer ou ir para a escravidão em uma terra estrangeira. Com compreensão, compaixão e ternura, explica que não pode pessoalmente se recusar a lutar, e a conforta com a idéia de que ninguém pode levá-lo até que seja sua hora de ir. O elmo reluzente amedronta Astianax e o faz chorar. Heitor o retira, abraça sua esposa e filho, e para acalmá-la reza alto a Zeus: que seu filho seja chefe depois dele e se torne mais glorioso em batalha.
Andrômaca, Astianax e Heitor, c. 360 a.C.

Duas vezes Polidamas insta Heitor a se retirar para a cidade, mas ele recusa.
Todos os troianos se refugiam na cidade, exceto Heitor, que sente a vergonha da derrota e resolve enfrentar Aquiles, a despeito das súplicas de Príamo e Hécuba, seus pais. Quando Aquiles se aproxima, Heitor fraqueja, e é caçado ao redor da cidade pelo grego. Finalmente, Atena o ilude para que páre de fugir, e ele volta para enfrentar seu oponente. Depois de um breve duelo, Aquiles transpassa o o pescoço de Heitor. Aquiles toma o corpo de Heitor e o desonra durante doze dias.

A Tróia de Heitor data de c. 1300 a.C., e parece ter sido destruída por uma guerra.
Tróia VII, muro da esquerda
Foi Tróia VII, na sucessão de nove cidades superpostas no mesmo local, oeste da Anatólia, hoje na Turquia. O rei Príamo é citado em textos cuneiformes hititas (povo que derrotou outros da região). Tróia VII era uma civilização da idade do Bronze.

Por que nove cidades foram construídas uma sobre a outra? 


E por que nos últimos milênios ficamos tão fascinados por histórias de guerra, a ponto de achar desinteressantes as que falam de vida em paz?

Fonte:
Karl Kerényi, Os heróis gregos