Baseado
em Joseph Campbell, Goddesses –
mysteries of the feminine divine, editado por Safron Rossi.
Se
na juventude teve que se separar de mãe e entrar no mundo masculino
para “encontrar seu pai” -
descobrir quem é e
desenvolver um ego capaz de assumir responsabilidades e funcionar no
mundo – na maturidade o herói precisa retomar o que deixou para
trás, retornar à totalidade que experimentou no começo da vida.
Em
1872 Heinrich Schliemann, escavando na Turquia, encontrou Tróia,
seguindo indicações da Ilíada. Nela Homero relatou a guerra que
durou dez anos, na qual Aquiles, que fora escondido por sua mãe para
não ser levado à batalha, morreu, mas só após matar o troiano
Heitor, o melhor dos homens de acordo com os gregos. Ulisses
(Odisseu) foi para a guerra a contragosto porque, recém-casado, seu
filho Telêmaco acabara de nascer. Heitor, Aquiles, Ulisses e os
outros são homens jovens, fortes, vivendo a jornada heróica
guerreira, própria de seu tempo e seus povos oriundos dos nômades
caçadores do norte da Europa.
A
guerra termina e vem o retorno, cada um para seu lar de origem. Aí
começa a Odisséia, segundo alguns escrita não por Homero mas por
uma mulher. Dörpfeld, seguindo a epopéia, escavou Ítaca,
mas não encontrou nenhum palácio. A
jornada de Ulisses é a volta para sua
esposa
– não uma vítima, troféu de guerra, como tantas mulheres na
Ilíada. A esposa simboliza a metade feminina do andrógino, Ulisses
tem que ser despojado da atitude do guerreiro, que não dá lugar
para o diálogo entre o masculino e o feminino. A Odisséia relata
uma iniciação: na relação apropriada com o feminino.
O
que os homens de Ulisses fazem, ao aportar na primeira cidade, é
atacá-la e estuprar suas mulheres. “Esta
não é a forma apropriada de convivência de um homem com uma
mulher”, dizem os deuses, e os navios são arrastados por dez dias.
As três deusas que estão na origem da guerra de Tróia,
Afrodite, Hera e Atena, terão que ser apaziguadas. Ulisses as
encontrará sob a forma de três ninfas, respectivamente Circe,
Calipso e Nausícaa.
A
jornada começa com todos sendo postos a dormir, e toda a iniciação
ocorre
no mundo dos sonhos, do inconsciente; são experiências místicas,
metafóricas.
O
primeiro encontro é com o guardião do umbral Polifemo – um
Ciclope,
filho de Posêidon, senhor do inconsciente – que pergunta a Ulisses
seu nome. Sendo bisneto do trapaceiro arquetípico Hermes, Ulisses
responde: “Ninguém.” Aqui ele se despiu de uma camada: sua identidade mundana.
Após cegarem o gigante os homens fogem sob os carneiros, símbolos do
sol – Ulisses se despojou de seu caráter social e se identificou
com a consciência solar, está agora no mundo espiritual.
Na
Ilha dos Ventos o deus Éolo lhe dá um saco cheio de vento que vai
levá-lo de volta a Ítaca, se aberto aos poucos. Mas Ulisses – a
consciência – dorme, e os subordinados – os instintos, o “eu
quero” - por curiosidade, soltam o vento. Depois da inflação
pela
primeira vitória, vem a deflação,
o vazio: eles têm que remar. O
próximo porto é uma ilha de canibais, que destróem onze dos
navios, sobrando só o de Ulisses. É o fundo do abismo.
Vem
então a Ilha da Aurora, da feiticeira Circe, a primeira deusa, a
tentadora, que é a iniciadora. Tece,
cercada pelos animais em que transformou os homens, e faz virarem
porcos os companheiros de Ulisses. Hermes aparece e diz a ele que
enfrente a ninfa e aceite compartilhar seu leito. É a primeira
experiência de Ulisses com uma mulher que se equipara a ele: ela tem
poder mágico, ele tem força física.
Circe
envia Ulisses ao mundo ínfero como primeira iniciação. Lá ele
encontra Tirésias, que foi em vida alternadamente homem e mulher.
Tendo aprendido sobre o androginato, Circe envia Ulisses à Ilha do
Sol – a luz da consciência.
O
primeiro perigo do caminho são as três sereias, que cantam a música
das esferas, afastando o viajante do interesse pelas coisas deste
mundo. Depois ele precisa passar entre as duas deusas opostas Cila e
Caribde, o rochedo da lógica e o abismo do misticismo.
Ulisses e as sereias |
Chegando à Ilha do Sol (Febo Apolo), cujos bois não é permitido matar e comer, Ulisses dorme, e seus homens assam e comem as vacas sagradas. Sucede que, em presença do poder divino maior, da consciência e energia da luz da vida, não se deve pensar em coisas mundanas. Zeus envia um raio que destrói o navio, só Ulisses sobrevive, e é arrastado, agarrado ao mastro, pelo caminho de volta. Seu destino não é a libertação sem retorno, ele deve voltar para a vida junto a Penélope.
Precisa
voltar ao mundo da experiência dual, e acaba na Ilha de Calipso,
ninfa de meia idade, com a qual vive por sete anos. Isto é
casamento.
Quando
ele aprende o relacionamento prático entre o masculino e o feminino,
Hermes vem buscá-lo.
É perseguido por Posêidon no limiar de retorno, mas Atena o ajuda e ele é jogado inconsciente, nu, na praia onde encontra a jovem e destemida princesa Nausícaa, que vê nele seu esperado herói. Ulisses se identifica para o rei e conta sua história.
É perseguido por Posêidon no limiar de retorno, mas Atena o ajuda e ele é jogado inconsciente, nu, na praia onde encontra a jovem e destemida princesa Nausícaa, que vê nele seu esperado herói. Ulisses se identifica para o rei e conta sua história.
De
volta para casa, dorme de cansaço e acorda em Ítaca, onde precisa
vencer os pretendentes de Penélope para voltar ao trono.
Do
ponto de vista de Penélope, ...